segunda-feira, 21 de março de 2011

Encontro com a poesia


Não conheço quem não goste de ouvir uma boa história. Melhor ainda, quanto mais estranha pareça ser, mais diferente do seu universo, do jardim que costuma vislumbrar da janela do quarto. É como se em contato com essas esquisitices pudéssemos colocar para fora sentimentos que não cabem em nossa própria narrativa, mas que mesmo assim vivem a nos pedir colo.
Conheço muita gente que não gosta de ouvir poesia. Que não consegue entender a beleza que às vezes não põe mesa ou o tempero da rima feita com esmero. Mas não se trata a poesia de nada mais nada menos do que uma história –ou fragmentos dela e de outras tantas, que se cria e eterniza ao som de melodias imaginárias? Uma narrativa que se forma da mistura da imaginação de quem escreve com a de quem lê? Como um terceiro paladar que se produz com a união do vinho com a refeição?
Nada mal. Mas o romantismo do argumento não convenceu meus pequenos a trocar um livro de histórias dos irmãos Grimm por um de poemas do José de Nicola noite dessas. Saquei em minha defesa a história da salada.
_Mas vem cá... quem é que fazia cara de tatu quando eu colocava salada no prato?
_Ah! Mãe não vem de novo com a história da salada!!
_Pois é... E quem agora briga quando não tem salada no almoço? Tudo nessa vida é exercício minha gente. (coloque aí uns blá blá blás de mãe que sabe quando deve vencer a briga)
Sempre funciona. A história da salada é tão infalível quanto dar de presente o CD do Paulinho da Viola em amigo oculto. Sempre dá certo. O fato é que escolhi na estante dos bermudas o livro Entre ecos e outros trecos, escrito por Nicola, autor de muitos de meus livros de Português do primário.
Então me diverti declamando os poemas que trazem com grande beleza o cotidiano do autor na cidade do interior em que vive. Em relevo macaco, bem-te-vi, pica-paus, aranhas e bichos grilo. E até outros trecos, como histórias de nuvens e estrelas, da rotina na escola e de personagens engraçados como a Maria Comilona que estampa a capa do livro, em belos traços de Maria Eugênia.
Em outras oportunidades o título nos acompanhou noite adentro. E nos fez imaginar nossas histórias dentro das histórias que vinham com rima. E observar, como fez meu caçula, que a poesia “é uma história que não vem pronta”. E chegar bem perto do que pensou o grande poeta Manoel de Barros quando escreveu “poesia é voar fora da asa”. E que assim como salada, poesia, faz falta.

terça-feira, 1 de março de 2011

Tra-la-laaaa...


Mais rápido que um elástico solto depois de esticado; mais poderoso que uma cueca samba canção e capaz de pular sobre arranha-céus sem a cueca apertar suas pernas... Esses são os atributos do super-heroi que acabei de conhecer, mas que já é febre entre as crianças há muito tempo. Por conta não de uma cueca, mas de uma bermuda fui apresentada a essa hilariante figura que sem cansaço luta contra as forças do mal. E só de cueca! Meu filho mais velho escolheu na biblioteca da escola o livro com a primeira aventura do personagem -de uma série de 8!

Estou falando do destemido Capitão Cueca. Tra-la-laaaa...Como? Não conhece? Nunca ouviu falar? Com certeza você tem 32 dentes e anda bem por fora do que acontece no mundo dos pequenos. Sim, ele é o heroi preferido da garotada na faixa dos 7 aos 10 anos. E de alguns pais também -como eu!

Editado pela Cosac & Naify o livro acompanha as estripulias de dois amigos-vizinhos Jorge Beard e Haroldo Hutchins (que aparentam ter uns 8 anos e pouco) na Escola de Primeiro Grau Jerome Horwitz. A dupla super responsável (quando alguma coisa acontece são sempre os responsáveis) e de uma veia artística muito forte (vivem fazendo arte) é a criadora do personagem de “poderes cuequísticos”. No fundo do quintal da casa de Jorge, mais precisamente na casa da árvore, em meio a pilhas de papel e um engradado de lápis e canetas nasceu nosso heroi. Haroldo é o inventor dos desenhos e Jorge o criador das aventuras. O resultado disso tudo é um gibi divertidíssimo que os inseparáveis arteirinhos vendem na porta da escola a cinqüenta centavos.

O livro é muito divertido e uma delícia de ser lido. Tem a pegada de "coisa proibida" que as crianças tanto gostam e se identificam. Como a lista de coisas engraçadas, mas completamente "fora da lei" que Haroldo e Jorge aprontam na escola - o pó de mico colocado no pom pom das líderes de torcida e o sabão nos instrumentos de sopro da banda do colégio.  Saltam aos olhos, também, (dos adultos, mas principalmente das crianças) os erros de português da dupla presentes nos diálogos do gibi artesanal. Prova de que é mesmo feito pelos dois pestinhas! Até o diretor do colégio (Sr. Krupp) não escapa das empreitadas. Numa hipnoze realizada pelos garotos o ranzinza se transforma no próprio Capitão Cueca - com direito a circular com uma capa feita de cortina, sem sua peruca  e com seu cuecão.

Sem falar no jogo do "vire-o-game" proposto pelo autor (uma aventura para os leitores). Nas cenas de "ação" da história as crianças podem balançar para frente e para trás uma das páginas do livro criando um movimento de cenas, com efeito de desenho animado. Genial!

Vale lembrar aos filhotes que a história é boa, engraçada, mas fruto da imaginação do autor Dav Pilkey – que criou o personagem aos doze anos. E aí está a grande sacada. Brincar com a ausência de limites é uma ótima maneira de discuti-los. Abre-se a oportunidade de colocar em pauta a questão da vida em sociedade. Fazê-los pensar sobre a noção de liberdade. Só há liberdade quando conhecemos nossos limites e o dos outros; e sabemos aproveitar a vida a partir disso. Porque a realidade nos pede essa consciência do outro. E a felicidade também.

O palhaço brinca no palco com suas desventuras e mazelas, mas sabe que quando tira a fantasia é simplesmente um homem. E que terá que lidar no mundo real com as mesmas desventuras e mazelas. Ainda assim isso pode ser divertido (ou desafiador). Tra-la-laaaa...